O Alto Comissariado de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou ontem (18) documento em que manifesta uma série de preocupações com a aprovação do substitutivo do relator Luiz Nishimori (PR-PR) para o Projeto de Lei (PL) 6.299/02 e outros 27 apensados, o Pacote do Veneno, que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos.
Assinado por cinco relatores especiais, a carta endereçada à diplomata Maria Nazareth Farani Azevêdo, ao ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira e o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), adverte o governo brasileiro que as modificações propostas ao atual marco legal sobre agrotóxicos “enfraquecem significativamente os critérios para aprovação do uso de agrotóxicos, ameaçando uma série de direitos humanos”, como a um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, à alimentação, à água segura, saneamento e à saúde física e mental.
Os signatários, entre eles o relator especial para o direito humano à água e ao saneamento, o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Minas Gerais, o brasileiro Léo Heller, fazem diversas críticas. Entre elas, a possibilidade que o Pacote abre para a fabricação de agrotóxicos no Brasil, para fins de exportação, mesmo daquelas substâncias ainda sem registro no país, o que “gera considerável preocupação, já que os agrotóxicos podem ser exportados para países sem um sistema adequado de redução de riscos para agrotóxicos.”
Eles destacam ainda a isenção de impostos concedidas para esses produtos, o que para eles estimula o uso, e a falta de prioridade para projetos de redução de agrotóxicos. É o caso do PL 6.670/16, que cria a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pnara), que ficou engavetado por mais de um ano até entrar em tramitação no início de junho.
A carta do Alto Comissariado é um reforço de peso para as mais de 250 entidades, associações, conselhos e órgão públicos, inclusive ligados ao governo federal, que atuam nas áreas de saúde, meio ambiente e direitos humanos, que já se manifestaram publicamente contra o pacote.
E demonstra a visibilidade internacional alcançada pela proposta rejeitada pela sociedade, encaminhada de maneira autoritária, sem o devido debate e que interessa apenas à bancada ligada ao agronegócio. Em nome de uma suposta defesa da agricultura nacional, seus defensores, todos integrantes da bancada ruralista no Congresso, defendem na verdade os interesses das indústrias do setor.
Trator
O comando da Comissão Especial da Câmara que analisa o relatório, também ligado à bancada ruralista, demonstrou constrangimento na reunião ordinária realizada hoje quando deputados contrários, entre eles Alessandro Molon (PSB-RJ), Ivan Valente (Psol-SP), Nilto Tatto (PT-SP), Assis do Couto (PDT-PR), João Daniel (PT-SE) e Bohn Gass (PT-RS) mencionaram o relatório da ONU entre tantos outros a alertarem para o perigo.
A reunião teve início às 10 horas – menos de 24 horas após o relator Nishimori divulgar a nova versão do seu substitutivo, em uma clara tentativa de dificultar manifestações contrárias da sociedade e a atuação dos deputados opositores.
O texto, que sofreu pouquíssimas alterações desde que foi retirado da pauta, em 16 de maio, devido a pressões, substitui o termo “defensivo fitossanitário” por “pesticida” e devolve à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a participação na análise de processos de registro. Pela versão anterior, os órgãos de Saúde e Meio Ambiente tinham seu papel reduzido à simples homologação, ficando a pasta da Agricultura com o controle total do processo.
A reunião foi suspensa às 15 horas, por causa do início da ordem do dia. Com cinco horas de duração, foi marcada por argumentos frágeis e insuficientes dos defensores do Pacote. Segundo eles, a agricultura precisa de agrotóxicos mais modernos e que quem é contra essa “modernidade” é contra o Brasil. Já os opositores defenderam o debate cuidadoso e a observância aos alertas do Instituto Nacional do Câncer, Fundação Oswaldo Cruz, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Ibama, Anvisa e agora a ONU, entre outros. Os agrotóxicos contaminam os alimentos, o solo, a água de rios e aquíferos e, comprovadamente, são causadores de diversos tipos de câncer, malformações congênitas, doenças neurológicas, distúrbios reprodutivos e está associado à depressão, autismo de mal de Parkinson, entre outros.
FONTE: CUT